sexta-feira, 7 de julho de 2017

O Hipocampo e nossa ideia de espaço - (Space Mapping)

Nestas duas últimas décadas, o GPS (localização geográfica) evoluiu a ponto de ser injetado no pequeno espaço de um celular, que cabe na mão de uma pessoa. Antes de conhecermos e nos admirarmos com este termo técnico, e usufruir das maravilhas que a sua teoria nos oferece na prática, conhecíamos algo a que chamávamos de:

SENSO DE DIREÇÃO

Temos, entre nossos amigos e colegas, aqueles a quem reputamos o dom de terem excelente noção de onde estão no momento e como vão chegar a determinado lugar com mais rapidez, pois tem uma capacidade maior de se situarem no espaço do que a maioria das pessoas.

Os taxistas londrinos

Entre as numerosas pessoas que o mundo dispõe, foi observado que os taxistas londrinos tinham um excelente Senso de Direção. A provável causa instrumental era a de que eles, para adquirirem uma licença de taxista, precisam decorar as rotas de taxi de Londres (pois nesta cidade o taxi não pode andar aleatoriamente pelas ruas, em qualquer caminho, mesmo obedecendo a mão de direção).

Tendo sido observado este dom, a doutora Eleanor Maguire e Hugo Spiers, entre os anos de 2010 e 2014, examinaram o cérebro, em funcionamento, de 79 taxistas londrinos e motoristas de ônibus da mesma cidade, para verificar, funcionalmente, o que estes apresentavam de diferente em relação aos cérebros das pessoas comuns, não taxistas (grupo de controle).

Os resultados deste estudo estão no paper "London Taxi Drivers and Bus Drivers: A Structural MRI and Neuropsychological Analysis". A conclusão mais incisiva foi a de que uma região, em especial, era maior do que a observada nas pessoas comuns: o Hipocampo.

O mais impressionante é que este pequeno órgão cerebral (o Hipocampo) já mostrava evidências claras de ser um dos principais responsáveis no processo de formação de memórias, entendimento e aprendizado. Seria a conclusão do estudo, de alguma forma, errada ? Claro que não, pois fora obtida pelas imagens dos "scanners" de Ressonância Magnética.

A metáfora da ideia de localização espacial

O que ocorre, é que a conceituação e a separação das ideias relativas ao entendimento e à localização espacial que nós temos, fruto do quase sempre enganoso SENSO COMUM, está errada.

Observem as metáforas linguísticas com as quais convivemos em nosso dia a dia:

  • "Vamos seguir uma linha de raciocínio";
  • "Em nossa caminhada aprendemos muitas coisas sobre a vida";
  • "Como vai você ?" (Como vai a sua vida ?);
  • "Em que ponto do trabalho você está ?";
  • "Quantas etapas faltam para o fim do seu projeto ?";
  • "Onde você pensa que vai chegar agindo desta forma ?";
  • "Nesta estrada (vida) só quem pode me seguir sou eu." (Música de Fagner);

Nestas metáforas vemos que o pensamento (raciocínio) tem uma linha, a vida é comparada a uma caminhada. Para saber como está a vida de uma pessoa, pergunta-se "Como vai você ?". Um trabalho, um projeto, é comparado a algo como uma estrada. O comportamento da pessoa a conduz a uma "chegada", ou seja, ao fim de um caminho. Na última a vida é comparada a uma estrada.

Em outras palavras, um órgão que parecia ser especializado em localização, senso de direção e percursos TENTA TRANSFORMAR INFORMAÇÕES NÃO ESPACIAIS EM IDEIAS DE ESPAÇO ATRAVÉS DE METÁFORAS. Esta é a constatação com base na evidência linguística. Um centro que parece de exclusiva finalidade geográfica explora as informações disponíveis cujas raízes sejam localizacionais e de percurso, para compatibilizar com as que não tem esta raiz, mas possam se ligar às primeiras.

Explicação na Fisiologia do Hipocampo

Como mostrado no artigo "Circuitos do Hipocampo" , este órgão cerebral recebe informações que ajudam na localização, oriundas do MEC (Medial Entorhinal Cortex). Estas informações são "traduzidas" pelas place-cells nas áreas CA1 e CA3 do Hipocampo, de forma produzir um "mapa" dos locais onde existem Coisas Agradáveis e Coisas Desagradáveis no ambiente. Este "mapa" não é um plano com informações detalhadas como compreendemos os nossos Mapas impressos reais, cheios de detalhes e com uma métrica muito bem definida. Este "mapa" é um espaço de sensações suficiente para que evitemos os perigos e sigamos as "rotas de recompensa", ou seja, caminhos que nos dão algo em troca.

Exemplificando, vamos descrever um mapa sensorial de um bar.

Você acabou de entrar em um bar ao qual nunca foi antes. A porta de entrada é mapeada como um local importante, pois é a sua "possivel rota de fuga" em caso de perigo. As mesas perto da porta são mapeadas como lugares mais tranquilos para você assentar, pois você se encontra em um lugar NOVO. Uma vez sentado, você olha para a mesa à sua frente, e ali tem três moças bonitas, onde apenas uma delas está abraçada a um rapaz. Esta mesa é mapeada como um "local de possível recompensa", pois pode ser que uma das duas moças sem namorado (a priori) corresponda à suas olhadas. A duas mesas de distância à direita, tem quatro rapazes mal encarados. Seu "mapa" interno marca aquele lugar como "local de possível confusão". Mais ao fundo está o balcão onde são feitos os pedidos de bebida. Seu "mapa" interno marca aquele local como "local de possível recompensa".

Em outras palavras. todo o ambiente é "mapeado" com sensações que vão guiar as nossas possíveis reações no ambiente, pois a primeira preocupação do Hipocampo, sendo parte de um sistema maior, o Sistema Límbico, que processa basicamente emoções, é a sobrevivência do indivíduo.

Conclusão

O Hipocampo forma um Ambiente com marcas dos locais onde é seguro ou não estar. E, além disso, influi na construção de metáforas do espaço, ao processar informações que não dizem respeito, à primeira vista, à localização do indivíduo.




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